Brasil faz obras nos vizinhos temendo China

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Com medo de perder espaço para a China na exportação de serviços de engenharia na América Latina, o governo está turbinando a concessão de financiamentos para empresas de construção com projetos na região. Líder nas Américas do Sul e Central, o Brasil praticamente multiplicou por 3.000% os valores liberados nos últimos sete anos para aumentar a competitividade das companhias nacionais nas grandes licitações da região.

Com a crescente internacionalização das empresas brasileiras e o aumento da concorrência com os asiáticos nos países vizinhos, a linha do programa BNDES-Exim para o setor saltou de US$ 42 milhões em 2002 para uma estimativa de US$ 1,26 bilhão neste ano, dos quais US$ 957 milhões já foram liberados até o mês passado.

Segundo levantamento da consultoria Valora, o Brasil exportou US$ 5,673 bilhões em serviços de engenharia para os países latino-americanos em 2008, que representam uma participação de 50% a 60% do mercado regional. A presença brasileira ocorre principalmente nas obras de infraestrutura de geração de energia, transportes e saneamento.
"Mundialmente o peso do Brasil é pequeno e já foi até maior nas décadas passadas na África e no Oriente Médio. Mas, na região, o país é inegavelmente o principal ator", afirma o sócio da Valora e ex-diretor operacional do BNDES-Exim, Renato Sucupira.

Entre os principais projetos tocados por empresas brasileiras com recursos do banco de fomento, estão a construção de três usinas hidrelétricas na República Dominicana e uma na Venezuela, linhas dos metrôs de Caracas e Santiago, dois gasodutos na Argentina e uma autopista em Cuba.

O vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil, José Augusto de Castro, afirma que, além de serviços de engenharia, arquitetura, construção e logística, esse mercado está atrelado a setores da indústria nacional, que fornecem máquinas e suplementos.

Segundo o estudo da Valora, cada projeto executado no exterior beneficia uma cadeia de até 1.500 fornecedores, a maioria pequenas e microempresas. A estimativa é que, para cada US$ 100 milhões em serviços exportados, outros US$ 400 milhões em bens seguem para fora do país pelo mesmo canal.

"Pode-se dizer que os serviços propriamente ditos representam só 20% das obras. E, como o BNDES obriga as construtoras a comprar o máximo no país, se não houvesse condições para competir nos projetos, esses equipamentos nunca seriam exportados", diz Castro.
Para ele, o Brasil ainda leva vantagem na região devido à possibilidade de fechar contratos por meio do CCR (convênio de créditos recíprocos), que funciona como uma câmara de compensação multilateral entre os membros da Aladi (Associação Latino-Americana de Integração). No entanto, a China, que em 2007 detinha apenas 4,5% do mercado no subcontinente, já começa a incomodar a posição brasileira.

"Os chineses já dominam a África, inclusive em mercados que nos eram cativos, como Angola, e agora estão cada vez mais presentes por aqui. A competição fica acirrada porque a China consegue financiar a preços e juros quase absurdos pois precisa gerar empregos."

De acordo com o diretor de negócios da Apex (Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos), Maurício Borges, o fortalecimento da imagem das construtoras nacionais em outros países ajuda a facilitar a atuação dessas companhias em um cenário de maior competição no mercado.
"Apesar de o crédito ter ficado mais escasso na crise, muitos países optaram pela estratégia de investir em obras de infraestrutura como política anticíclica. Neste ambiente, as empresas precisam ser cada vez mais flexíveis para conseguir fechar contratos."

Identificar oportunidades
Para o diretor de estruturação financeira da Andrade Gutierrez, Luiz Cláudio Jordão, o grande papel das construtoras é identificar oportunidades de negócios no exterior e transformá-las em projetos -que dificilmente seriam executados sem o suporte do BNDES para as compras de suprimentos no país. Ele cita os dois gasodutos construídos pela empresa na Argentina, que tiveram 80% dos US$ 300 milhões do custo da obra financiados pelo banco.
Apesar da boa penetração da companhia na região, Jordão já sentiu na pele o peso da concorrência asiática. A Andrade Gutierrez foi responsável pela construção do primeiro trecho de uma ponte em Guayaquil (Equador), mas perdeu para uma empresa da China o contrato para o restante da obra.

"Os chineses têm incomodado muito a gente. Se eles são pré-qualificados para disputar o projeto, geralmente ganham, porque são imbatíveis no preço", completa o executivo.

Eduardo Rodrigues
Folha de São Paulo
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