Geldof rebate críticas a shows beneficentes

Ecoturismo & Sustentabilidade

O irlandês Bob Geldof tornou-se relativamente conhecido no final dos anos 1970, como vocalista da banda The Boomtown Rats (do hit "I Don't Like Mondays"). Mas passou a frequentar reuniões com chefes de Estado a partir de 1985, quando organizou o Live Aid, evento que pretendia chamar a atenção para a fome na África. Hoje com 57 anos, Geldof é um dos principais ativistas da música pop -foi o idealizador do Live8, em 2005. Nesta semana, ele vem pela primeira vez ao Brasil para participar do Back2Black, evento que se propõe a celebrar a África (leia mais à pág. E5). De Washington (EUA), Geldof concedeu entrevista por telefone à Folha.


FOLHA - Quatro anos depois, como vê os concertos do Live8?
BOB GELDOF - Você realiza esse tipo de evento por alguns motivos políticos. Fiz o Live Aid há 25 anos porque havia uma necessidade daquilo, o povo africano estava morrendo de fome. Mas por causa da Guerra Fria não dava para fazer nada muito incisivo, havia países ligados aos EUA e à União Soviética. Quando a Guerra Fria acabou, pudemos lidar com o problema africano de outra maneira. Falei com [Tony] Blair sobre como a África estava distante do desenvolvimento econômico mundial. Ele tocou no assunto nas reuniões do G8 e a África tornou-se um ponto de discussão para a politica britânica desde então. Depois disso, 37 milhões de crianças foram à escola pela primeira vez. Em 2005, 3 milhões de pessoas começaram a receber tratamento contra a Aids. Cerca de US$ 50 bilhões são destinados à África, dinheiro que tornou-se possível com o Live8 e com o lobby que fizemos no G8.

FOLHA - Algumas pessoas dizem que eventos beneficentes, principalmente em relação à África, não atingem seus objetivos. O que acha?
GELDOF - As criticas são válidas se os concertos não atingem os objetivos. Com o Live8, conseguimos colocar 37 milhões de crianças em escolas. Como criticar isso? Se chegarmos a arrecadar US$ 50 bi para a África em 2010, é algo para ser criticado? Se você falhar, será alvo de críticas, mas vale a pena tentar. Algumas pessoas gostam de escrever, de montar uma peça, eu sou um músico, gosto de fazer e participar desse tipo de coisa.

FOLHA - Bandas e artistas mais novos dificilmente falam sobre política e problemas sociais. É frustrante?
GELDOF - Não tenho problemas quanto a isso. O objetivo de um artista é criar arte. Um artista falha quando não cria boa arte. Se você tem um problema no banheiro e chama um encanador, você quer que ele resolva o problema e não que fique falando sobre os problemas do mundo. Apenas conserte o meu banheiro! É assim com arte. O artista deve criar arte, não importa se é política ou não. Nos anos 60 e 70, Jagger e Lennon gostavam de falar sobre política. É algo de minha geração, minha geração veio do punk, foi uma geração política. Quando chamo artistas jovens para participar de um evento, eles não necessariamente têm noção do que ocorre com o mundo, mas querem participar. E isso é válido.

FOLHA - Os europeus têm plena consciência do que ocorre na África?
GELDOF - No Reino Unido, há essa consciência. Não esqueça de que a África está a apenas 8 ou 9 milhas [cerca de 14 km] da Europa. Outro ponto: há 900 milhões de consumidores na África, portanto grandes oportunidades no continente, e os europeus estão dando conta disso. Até para os problemas energéticos estamos olhando para a África. Os europeus estão mais conscientes até devido aos problemas de imigração.

FOLHA - Quais os principais problemas na África? Em quais países?
GELDOF - Há 53 países na África. Eles são muito diferentes entre si. Alguns precisam de nossa ajuda mais do que outros. A África necessita diversificar e desenvolver sua economia. Não há infraestrutura, não há estradas, os portos estão em más condições. Para produzir algo na África e exportar aquilo, é preciso passar por quatro ou cinco fronteiras, é muito caro e complicado. Os países africanos são politicamente independentes há pouco tempo. Mas a África vem se desenvolvendo economicamente, a uma taxa até maior do que a da maioria dos países em desenvolvimento. Passei 26 anos trabalhando com a África e continuo nessa missão. Kofi Anan, Tony Blair, Bono são meus amigos e trabalham pelo continente. Há conflitos, mas estão diminuindo.

FOLHA -
Você é criticado por falar sobre pobreza, mas cobrar muito dinheiro para falar em palestras. O que diz sobre isso?
GELDOF - Se as pessoas querem me pagar, tudo bem, se não querem tudo bem. Às vezes faço por nada, às vezes por uma pequena quantia. Não é um problema. Se eu tiver que ir a uma grande companhia privada na China, por exemplo, para falar sobre África, não vou fazer isso de graça. Essa questão não é um problema para mim.
Thiago Ney
Folha de São Paulo
0 Responses