O aquecimento está aí. E nós podemos lucrar com ele

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A Conferência de Copenhague, em dezembro, ditará o ritmo com que o mundo terá de se reinventar para reduzir as emissões de CO2. A boa notícia é que nessa nova economia que se configura dois países surgem como os prováveis vencedores: China e Brasil

Não se trata mais apenas de ursos polares se equilibrando em calotas de gelo que insistem em derreter. O aquecimento global começa a mostrar seu impacto diretamente na economia. Na Austrália, por exemplo, uma forte seca está acabando com o agronegócio -- um dos pilares do desenvolvimento do país. Um recente estudo feito pelo Global Humanitarian Forum, presidido por Kofi Annan, revela que mais de 325 milhões de pessoas já têm sua rotina afetada pelas mudanças climáticas, a um custo econômico de 125 bilhões de dólares por ano. Mesmo com tais alertas não há hoje sinais concretos de que a reunião de Copenhague trará respostas definitivas para a questão. Enquanto União Europeia e Japão têm metas para a redução de CO2, os Estados Unidos devem chegar à conferência sem divulgar seus objetivos - embora Barack Obama tenha feito promessas de campanha ao lado de um dos mais proeminentes ambientalistas do mundo, o democrata Al Gore.

Qualquer que seja o desfecho da discussão, porém, já é possível ter duas certezas. A mais óbvia é que resolver esse imbróglio é essencial para garantir o futuro do planeta. A outra é que nessa disputa alguns países vão se dar melhor que outros -- e o Brasil, graças a fatores como matriz energética e florestas (nativas e plantadas), surge como uma das potências do novo cenário. "Ninguém está tão preparado para se dar bem em uma economia de baixo carbono como nós", afirma Tasso Azevedo, consultor do Ministério do Meio Ambiente em questões de clima e de florestas.

Azevedo não está sozinho nesse discurso. Um dos mais eloquentes defensores dessa tese é o físico José Goldemberg, um dos maiores especialistas do mundo na área de energia. "Quaisquer que sejam os encargos e as obrigações resultantes da Conferência de Copenhague, temos todas as condições de cumpri-los, sejam eles apresentados com a retórica de "compromissos voluntários", como prefere o Itamaraty, ou de compromissos mandatórios resultantes de um acordo internacional", diz Goldemberg. As oportunidades, segundo ele, vão da exportação de etanol à geração de empregos com negócios "verdes".

O otimismo tem ganhado corpo também no setor privado. "Está claro que, daqui para a frente, as economias que conseguirem produzir bens com menos emissões sairão na frente", afirma Wilson Ferreira Júnior, presidente da CPFL, uma das maiores geradoras e distribuidoras de energia do país. "E nós já fazemos isso, porque temos a matriz elétrica mais limpa do mundo." Cerca de 85% baseada em fontes renováveis, a matriz brasileira é mesmo um patrimônio a ser valorizado. Dois terços da matriz elétrica da China, por exemplo, estão baseadas no carvão mineral.

Assim, o raciocínio de especialistas e executivos do setor é que o Brasil deveria criar um selo verde que diferenciasse nossos produtos lá fora. A ideia pode parecer utópica, mas tem sido cada vez mais defendida por especialistas brasileiros e estrangeiros. "Não tem gente que paga mais caro por um computador que tem o selo Intel Inside?", pergunta Ferreira, da CPFL. "Acho factível que consumidores paguem mais caro por um produto que tenha o selo Clean Energy Inside (numa tradução livre, ‘Aqui há energia limpa’)."

Para que esse tipo de sonho econômico se torne realidade será preciso fazer alguns avanços -- e cuidar para manter o que já foi conquistado. Pensadores como Goldemberg alertam para o fato de que, se o governo continuar privilegiando a construção de termelétricas movidas a carvão e óleo diesel, como vem fazendo nos últimos anos, até 2017 as fontes renováveis responderão por apenas 75% da matriz -- o que inevitavelmente reduziria o brilho do tal selo verde.

A questão mais crucial, porém, é outra. O Brasil precisa se livrar do fantasma do desmatamento da Amazônia, que responde por 60% de suas emissões e o coloca na posição nada meritória de quarto maior emissor do planeta.

Ana Luiza Herzog
Revista Exame
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