Museu da família Disney apresenta bastidores da magia nos EUA


O Museu da Família Walt Disney, inaugurado recentemente em Presidio (Califórnia), é tão grande que parece que você vai encontrar um brinquedo do parque lá dentro. De certa forma, há diversão, visto que o museu faz exatamente o que Disney queria quando criou a Disneylândia: contar uma história.

Embora o museu conte a história lentamente, narrando, vez ou outra, fatos desconhecidos, há emoção suficiente para crianças e adultos.

Quem é que precisa da Terra da Fantasia, da Terra do Amanhã, dos Piratas do Caribe, dar uma volta na montanha-russa Matterhorn, ou de um Abraham Lincoln Robótico, quando a história contada no museu toca experiências de todos que vivenciaram as emoções do parque da Disney no século 20?

A diversão em questão é uma longa caminhada de 1.765 metros quadrados entre as galerias desse novo complexo. Foram necessários US$ 110 milhões para transformar os alojamentos do Exército e os dois prédios vizinhos no lugar responsável por contar a história da vida e do trabalho de Disney.

Os objetos do museu parecem de segunda-mão, visto que são rascunhos dos personagens originais e de alguns lembretes de animação dos sete anões (Dunga: "Suas roupas compridas", ou Dengoso: "A cabeça para baixo, os olhos para cima") em vez de vê-los cantarolando "eu vou, eu vou, pra casa agora eu vou".

Não se pode dizer que a carreira de Disney se baseia apenas nas histórias de aventura: ele sabia como criar desenhos animados e parques de diversão, além de também criar empresas que faziam as duas coisas. É uma vida de aprendizagem, trabalho difícil e algumas controvérsias.

Disney real
A motivação para a construção do museu não era apenas trazer diversão. Algum tempo depois da morte de Disney, em 1966, sua filha Diane Disney Milles descobriu que cada vez menos crianças sabiam quem o seu pai realmente era.

Algumas biografias recentes também não deram muita importância a sua vida e ao seu casamento, relatou Diane em uma entrevista recente para o The New York Times. Foi então que a Fundação da Família Walt Disney, uma organização sem fins lucrativos, decidiu criar um museu inteiramente em homenagem a Disney.

Seus arquivos pessoais são enormes, mas suas principais relíquias e obras de direito autoral estão sob a guarda da Empresa Walt Disney, que emprestou os materiais do museu, incluindo uma câmera de animação "multidimensional" de dois andares, usada para criar os efeitos tridimensionais em "Pinóquio" e "Fantasia." Um cinema de 114 lugares no museu exibirá espetáculos e filmes da Disney.

A princípio, o museu (planejado por Page & Turnbull) parece ser exatamente o que promete ser: uma instituição familiar projetada para desfazer qualquer imagem negativa e homenagear o grande homem. O hall de entrada é uma galeria enorme que exibe os prêmios, certificados e estatuetas de Disney. Neste hall, também estão o certificado de honra de Harvard e o Oscar especial por "Branca de Neve" em 1938. Além disso, encontramos minúcias como uma placa dedicada a Disney, em 1959, durante a "Semana do Anúncio Nacional", sobre um anúncio que ele respondeu em 1920, que procurava um "homem de primeira classe" para fazer "caricaturas e desenhos".

Porém, o impulso de colocar o resto dos objetos da família à mostra foi contido por Richard Benefield, diretor executivo e ex-diretor suplente do Museu de Arte da Universidade de Harvard, "o Museu da Disney é muito mais do que isso".

Não há pistas das tensões familiares descritas, por exemplo, na biografia recente de Neal Gabler. Há muito mais para ser descoberto sobre a vida de Disney e as frustrações de suas últimas décadas. Sua imaginação era tão capaz, sua ambição era tão disciplinada e suas conquistas eram tão importantes para a evolução da mídia de entretenimento americano que ele parece uma força natural.

Os filmes da família em exibição mostram o jeito infantil de Disney, principalmente com suas duas filhas.

Como mostra o museu, a motivação de Disney era inabalável. Apesar de ter dominado os fundamentos da animação nos anos 20, ele continuou criando novas possibilidades.

Em uma de suas primeiras conquistas, "Alice no País das Maravilhas", uma garota visita um estúdio de animação e dorme profundamente. Ela sonha que faz parte do desenho, misturando fantasia e realidade, uma visão que Disney deve ter compartilhado. Pequenas telas mostram clipes de Alice desenhados por Walt, que foram emoldurados com desenhos maiores, aumentando a diversão.

Disney entrou em uma nova era com o seu primeiro desenho animado sonoro, "Vapor Willie", o terceiro estrelado por Mickey Mouse. Hoje, é fácil falar, mas na época foi necessário selecionar uma tecnologia cara, desenvolver uma técnica para coordenar a música e a imagem, e convencer os distribuidores de que o investimento valia a pena. Nada foi fácil: uma parede no museu contém uma seleção de 348 figuras ampliadas do desenho, que não ultrapassa um minuto de ação.

Houve outros desafios. A primeira empresa de Disney faliu. A segunda, criada com seu irmão Roy, foi quase destruída por um rival invejoso que roubou seus funcionários e um dos primeiros personagens de Walt Disney, Oswald, o Coelho Afortunado.


Da ruína nasceu a ideia do Mickey Mouse, uma criatura tranquila, cuja valentia e autonomia chamaram a atenção (essas características também repercutiram com o clima do momento). Outra parede exibe as artimanhas do Mickey, que deixarão seus colecionadores babando. Também mostra como Disney encontrou uma maneira de comercializar seus personagens rapidamente, transformando a indústria cinematográfica.

Entretanto, se Disney não tivesse interesse no personagem e na história, isso nos teria levado à febre de consumismo de hoje. Ele vivia sem dinheiro, não porque gastava muito, mas porque ele era um idealista compulsivo, tentando ir além os desenhos comuns.

Quando ele criou seu primeiro longa-metragem, "Branca de Neve e os Sete Anões", ele já tinha transformado sua própria noção de animação. Disney defendia que os desenhos literalmente animam o mundo, trazem tudo à vida que até mesmo objetos inanimados passam a ter vida. Ele motivava a sua equipe ao realismo (e patrocinou aulas de desenho em seus estúdios). Mas ele queria ir além da realidade: Até mesmo mesas e árvores tinham personalidade.

Um dos objetos mais fascinantes do museu é um caderno gigante criado por Herman Schultheis, técnico do departamento de efeitos fotográficos do final da década de 30. A obra documenta como as imagens foram produzidas em "Pinóquio" e "Fantasia". Ao lado do caderno, uma exposição animada do livro responde ao toque. Você pode quase sentir a imaginação dos criadores ao transformarem objetos reais em desenhos coloridos.

O museu ainda descreve a greve dos animadores em 1941, que chocou tanto Disney que, depois da Segunda Guerra Mundial, ele se tornou testemunha fervorosa do Comitê de Atividades Não-Americanas da Câmara; as exibições apresentam entrevistas com funcionários das duas linhas de protesto.

Outras exibições cobrem os anos de Guerra, filmes de ação pós Guerra, como o "20.000 Léguas Submarinas", e filmes de natureza. Por fim, um prédio vizinho do Presidio, uma galeria onde o trem de brinquedo, no qual Disney andava em sua propriedade, - está à mostra, juntamente com um modelo de seus planos originais para a Disney.

Nesta última galeria, os detalhes são menores. Numa sala menor que o local onde foi definido o início da revolução das animações de Disney, ficamos sabendo sobre o seu trabalho com a televisão nos anos 50, (com o "Zorro" e "O Clube do Mickey"), os anos de filmes contínuos, os fracassos e os sucessos, e as últimas fantasias de Disney de uma utopia urbana que ia ser construída ao lado da Disney World, na Flórida.

Há muito para se admirar aqui (o espaço é também dedicado às criações de Disney para a Feira Mundial de Nova York de 1964-65 e pelo filme "Mary Poppins"). Fica claro que sua energia e imaginação permaneceram intactas até sua morte por câncer de pulmão, aos 65 anos, e que a trajetória que ele trilhou na década de 30 foi deixada para que outros explorassem.

Ele foi pioneiro em embalagem e sinergia, mas nada conseguiu superar o padrão artístico como os primeiros filmes fizeram, e nenhum outro desenho animado ganhou tanta atenção de Disney. Ele estava preocupado com outras coisas. É como se um de seus personagens tivesse escapado de um celulóide para testar seus sonhos no mundo real --Alice voltando ao país das maravilhas. Tanto esforço gerou muitos tipos de resultados, mas valeu a diversão.

New York Times
Foto: Eric Risberg/AP
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